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segunda-feira, 10 de março de 2008

'Entrei na Espanha e já consegui emprego'

Repórter da Folha teve de responder a uma só pergunta da imigração ("o que veio fazer aqui?") para entrar no país

Menos de 24 horas bastaram para conseguir um emprego de garçom na Espanha, ganhando cerca de 800 euros mensais (R$ 2.032)

André Camarante, da Folha Online, direto de Madri

Sem declarar o endereço do lugar onde pretendia ficar hospedado e mesmo sem informar se tinha um local para ficar, sem preencher corretamente a ficha de imigração exigida pela Espanha para os estrangeiros que tentam entrar em seu território, sem dizer quanto portava em dinheiro e sem o obrigatório cartão de seguro de saúde para turistas.

Foi dessa maneira, sem esclarecer todos os requisitos exigidos pela Espanha para liberar a entrada de estrangeiros em seu território, que a reportagem da Folha, sem se identificar como tal, entrou sábado no país. Mais do que isso: conseguiu emprego em menos de 24 horas.

O desembarque ocorreu no aeroporto internacional de Barajas, em Madri, por volta das 10h30 (6h30 no horário de Brasília), no vôo JJ 8064, da TAM, que deixou São Paulo sexta-feira à noite.

Para conseguir o carimbo de autorização de entrada na Espanha, bastou a reportagem responder a uma única pergunta ao agente de "La Migra" espanhola que ocupava, no sábado, o guichê número sete da imigração em Barajas. "O que o senhor veio fazer aqui?", perguntou o agente. "Turismo", respondeu o repórter.

Mas as recentes denegações de brasileiros em Barajas - uma das principais portas de entrada dos latino-americanos que vão à Europa atualmente - fizeram com que, por mais inusitado que pareça, o embarque do vôo JJ-8064, no aeroporto internacional de Cumbica, em Guarulhos, fosse mais rigoroso do que a chegada a Madri.

O risco de ser barrado em Barajas já era o assunto recorrente na fila de embarque quando uma funcionária da TAM, ainda no check-in, tratava de alertar todos os que não sabiam das exigências para entrada na Espanha e os conseqüentes riscos de serem barrados em Barajas.

Foi assim com a reportagem:

"Lugar da hospedagem em Madri para a emissão do seu bilhete, senhor?", questionou a funcionária Shayane, da TAM. "Não tenho lugar definido ainda, senhora." "Então, não vou poder emitir sua passagem", foi a volta dela, já balançando a cabeça. "Mas, quando comprei a passagem, não me disseram que não poderia viajar sem lugar definido para ficar. Já que é assim, põe qualquer coisa aí."

"Então não tem bilhete, senhor, pois, sem o endereço no destino declarado vai contra as nossas normas", disse Shayane. Ao ouvir o nome de uma rede qualquer de hotéis, Shayane resolveu emitir o bilhete.

No A-330 da TAM, o assunto ainda era o mesmo entre grande parte dos que tinham passaportes brasileiros: com o veto aos sete espanhóis em Salvador, na quinta, todos faziam pensamento positivo para não ser a "bola da vez" e perder a viagem a Madri por possíveis retaliações em Barajas.

Descontração

Descontração só no início do vôo, quando ainda era possível ver as luzes da Grande São Paulo. "Senhores passageiros, por determinação do governo da Espanha, essa aeronave terá de ser pulverizada, mas ressaltamos que os produtos são naturais", disse uma voz que partiu da cabine e que, na seqüência, foi motivo de risadas e piadas.

"Estão vendo só, o governo espanhol não quer nem saber do cheiro dos brasileiros", foi uma das piadas ouvidas.

Para grande parte dos passageiros do JJ-8064, a passagem pela imigração espanhola não foi nada traumática na manhã de anteontem, com exceção de uma mulher com longos cabelos pretos, morena, com lentes azuis, calça jeans apertada e olhar de tensão permanente.

Antes de a reportagem passar praticamente sem maiores explicações pelo guichê sete de "La Migra", a mulher morena foi separada pelo mesmo agente da cabine e mandada para uma salinha do aeroporto. Minutos antes, um casal que falava espanhol alto e rápido foi retirado do guichê que atendia especialmente a fila de "La Migra" reservada para carimbar passaportes dos cidadãos da comunidade européia. Foram levados a uma salinha - a mesma para onde foi a brasileira de lentes azuis.

Aliás, os agentes foram mais rigorosos com o casal do que com a morena. Para ela, o agente do guichê sete disse "vá para aquela sala e sente-se até que alguém irá conversar com você mais tranqüilamente". Para o casal de fala acelerada, um agente de "La Migra", baixinho, bigodudo e com jeito de ser o chefe do setor, falou: "Se vocês dois não querem voltar daqui mesmo para o lugar de onde saíram, fiquem calmos e respeitem as leis da Espanha! Aqui tratamos todos iguais".

Na fila, se ouviu, em português: "Será mesmo?"

Comentário do leitor Célio Rodrigues

A partir dos anos 70, a economia nacional começou a crescer. E foi crescendo pelos anos 80, 90, 00. Só que o Brasil crescia para os ricos. Os pobres ficaram cada vez mais pobres e foram morar em favelas.

Para conseguir bons trabalhos, começou a "diáspora tupiniquim": brasileiros deixando o "país do futuro" (Stephan Zweig) para tentar um "país do presente", onde poderiam ter uma vida mais decente que não tiveram em seu país.

As lideranças políticas corruptas, empresários predadores, "coronéis" e oligarcas não deram aos brasileiros os exemplos de honestidade e ética comportamental. Eles sairam pelo mundo afora sem o devido preparo intelectual ou profissional. Essa falta de exemplo das lideranças foi crucial no convívio deles no exterior.

Nos EUA, quando os imigrantes italianos, espanhóis, alemães, gregos chegam lá, seus compatriotas os ajudam. Não dando-lhes dinheiro ou recebendo-os em casa, porém, conseguindo-lhes trabalho, orientando-os sobre o "modus vivendi" do país.

Via de regra, diferente dos citados acima, os brasileiros são desunidos (não todos - 7 em cada 10), exploram seus compatriotas, tirando toda a vantagem possível da situação. Geralmente cobram para arrumar trabalho. Há ainda os que delatam ilegais à Imigração por 50 dólares cada.

Matéria editada pelo RA.

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