Com o paraíso na alma sertaneja
De segunda a sexta, meu horário de voltar para casa costuma coincidir com o início da novela "Paraíso". Sim, eu sou noveleiro, mas só quando gosto muito da história, dos atores e, principalmente, do autor. E o Benedito Ruy Barbosa é um dos meus poucos favoritos, mesmo com algumas restrições, entre elas, o cansativo proselitismo político na boca de alguns personagens e a repetição de frases do tipo "já sofri muito nessa minha vida" usadas em todas as suas novelas.
No entanto, para quem nasceu e cresceu no interior do Brasil, é impossível resistir ao chamado das origens, que se manifesta no sotaque caipira, na paisagem rural e na música sertaneja. Benedito sabe como ninguém explorar esse tema, já que ele mesmo é um homem do interior (nasceu em Gália, pequena cidade paulista). Daí o sucesso das suas novelas, sempre autênticas e saborosas como galinhada de fogão a lenha ou cafezinho coado na hora.
Na atual versão de "Paraíso" a história se passa no interior de Mato Grosso, mas é como se estívessemos em Minas, Goiás ou São Paulo. Não só porque o Pantanal quase nunca aparece, mas pela trilha sonora recheada de modas de viola típicas do interior desses três estados brasileiros. E o melhor de tudo é que as músicas são cantadas "ao vivo" - durante as gravações - por gente que entende do riscado, como Victor e Leo, Bruno e Marrone, Chitãozinho e Chororó e o também ator Daniel. Todo dia tem show de viola, seja em volta de uma fogueira, numa mesa de bar ou no auditório da rádio da cidade.
E aí é que a porca torce o rabo, pois não tem nada mais bonito nessa vida (olha eu imitando o Benedito) do que o som de uma viola bem tocada, ali na hora, você vendo o violeiro ponteando cada acorde. Junte-se a isso a produção super caprichada da Globo - que faz o telespectador viajar no tempo e no espaço - e temos momentos de grande emoção, como uma cena de hoje em que todos os violeiros se juntaram para cantar a belíssima "Tocando em frente", de Renato Teixeira e Almir Satter.
Sobre as mesas do bar (coladas umas às outras), garrafas e copos meio cheios ou meio vazios de cerveja ou de cachaça esperando a pausa dos violeiros. Nada mais interior do que isso. Nada melhor do que isso.
Conhecer as manhas e as manhãs
O sabor das massas e das maçãs
É preciso amor para poder pulsar
É preciso paz pra poder sorrir
E é preciso a chuva para florir
Todo mundo ama um dia, todo mundo chora
Um dia a gente chega, no outro vai embora
Cada um de nós compõe a sua própria história
E cada ser em si carrega o dom de ser capaz
De ser feliz...