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domingo, 11 de novembro de 2007

Como se fabrica uma notícia

Ruy Fabiano, no Blog do Noblat

Na quinta-feira, 8, os jornalistas foram surpreendidos por uma boa notícia – coisa rara, nestes tempos: a Petrobras havia encontrado vasto campo de gás e petróleo na Bacia de Santos. Mais: a descoberta elevaria as reservas brasileiras em 50%. Nada menos.

Neste momento em que as dificuldades comerciais com a Bolívia de Evo Morales ameaçam o abastecimento de gás, a notícia pareceu ainda mais auspiciosa. Infelizmente, porém, não é bem assim. A "descoberta" ocorreu há dois anos – e já havia sido anunciada, mais especificamente em 5 de setembro de 2005.

De lá para cá, não houve novidade que justificasse trazê-la novamente à tona – a não ser, claro, criar um falso clima de euforia, que fez com que as ações da Petrobrás valorizassem em 14%. Esse, porém, é apenas um subproduto. Qual será o real objetivo de apresentar com estardalhaço uma notícia velha, sem que nada de novo a ela se tenha acrescentado, de modo a justificar sua reedição?

Mesmo as projeções em relação à descoberta não constituem novidade. Já haviam sido feitas dois anos antes. A operação comercial do primeiro campo da Bacia de Santos só começará em 2011, e apenas para testar sua viabilidade.

Confirmadas as estimativas, a exploração – se houver, pois há dificuldades operacionais que a põem em dúvida - começará apenas por volta de 2013 ou 2014. Isso, aliás, já havia sido dito antes.

O óleo encontrado está entre 4.500 e 7 mil metros de profundidade. As prospecções da Petrobrás vão a no máximo 2.700 metros de profundidade. Mais do que isso, o custo operacional aumenta enormemente – e a empresa admite nem poder estimá-lo. Informa apenas que, mesmo em profundidades menores, a exploração de um campo que produza 150 mil/barris dia fica acima de US$ 1 bilhão, o que já é um custo monumental.

Para profundidades como as previstas nesse campo, ainda não há nem tecnologia, nem recursos. Ou seja, a descoberta, cuja viabilidade exploratória ainda nem está avaliada, tem, por enquanto, sua prospecção inviabilizada em face do custo.

Não obstante, Lula sapecou: "Parece que entramos para a Opep, não é Dilma (Roussef, chefe da Casa Civil)?" E Dilma, no mesmo tom de euforia: "Nós saímos de uma situação de um país que estava se tornando auto-suficiente para a de um país exportador - patamar em que estão países como a Venezuela e os árabes."

O diretor da Petrobrás, Guilherme Estrela, menos afeito à coreografia marqueteira, foi bem mais sóbrio: "O que encontramos dá robustez às nossas hipóteses, mas ainda é uma hipótese".

Isso, porém, não está no press-release da Secretaria de Comunicação da Presidência da República (Secom). É preciso que o repórter seja um chato e se disponha a prospectar esses, digamos, detalhes junto à área técnica da Petrobrás para decompor a notícia. Feito isso, ela desaparece das manchetes, perde seu glamour e deixa de ser o que objetivou ser: instrumento de propaganda governamental.

Especulou-se que Lula havia feito o re-anúncio da descoberta como recurso estratégico preliminar para a visita que faz a Evo Morales. Improvável. As agressões do governo Morales ao Brasil – e mais especificamente à Petrobrás – em nenhum momento incomodaram o governo Lula.

Como se recorda, o governo Lula, desde o primeiro momento sustentou o direito de a Bolívia fazer o que fez: rasgar um acordo comercial e se apropriar militarmente de uma refinaria brasileira. A visita de Lula reveste-se da cordialidade de sempre. A farsa do re-anúncio, portanto, não se dirige a Morales.

Dirige-se a nós mesmos.

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