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segunda-feira, 20 de abril de 2009

Pesadelos culturais

Crônica de Nelson Motta (via e-mail)

Outro dia tive um sonho bom - havia acabado de escrever um livro - que logo se transformou em pesadelo: eu era um escritor cubano, peregrinando por editoras do Estado e implorando para que publicassem o meu livro, em vão. Para uns era muito popular, para outros muito sofisticado. Para alguns companheiros era muito romântico e para outros "cabeça" demais. Ou muito denso ou excessivamente superficial.

Cada editora dava novos motivos para o seu não. Ninguém dizia, mas todos insinuavam que era burguês e contrarrevolucionário, apenas diversão. Eu argumentava que era isto que eu queria, divertir com uma ficção, e eles riam. O povo não precisa de entretenimento, precisa de cultura, rugia um velho escritor do Partido que ninguém lia.

Ninguém leria o meu livro, eu me juntaria a Reinaldo Arenas, Guillermo Cabrera Infante e Pedro Juan Gutierrez entre os que jamais seriam publicados na ilha. Os best-sellers internacionais de Gutierrez só não interessaram a editoras cubanas, com o argumento de que não eram comerciais, não venderiam. Nada de censura política ou estética, apenas uma prática de mercado, à cubana.

Acordei aliviado em Ipanema. Pero no mucho. Saí em peregrinação por gerentes de marketing de telefônicas e de estatais em busca de patrocínio para minha peça. Ou seria filme? Ou disco? Ou livro? O pesadelo continuava, as razões e os motivos para dizer não eram parecidos com os dos burocratas cubanos, a diferença era a divindade que uns chamavam de A Revolução e outros de A Empresa.

Em comum, o desprezo pelo público, pela população, pelos que pagam impostos. O curioso é que eles usam dinheiro público, de renúncia fiscal, como se fosse deles, com o mesmo zelo que os políticos têm pelas verbas públicas.

Será que não é possível encontrar outras formas de fomentar e financiar a produção artística, sem a ditadura da burocracia política, sindical ou empresarial? O chato é a certeza de que pelo menos 90% da produção que se diz ou ambiciona ser artística é apenas lixo audiovisual, teatral ou literário. Talvez seja o preço para a criação dos 10% que podem ser chamados de arte.

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