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domingo, 10 de janeiro de 2010

Como se fosse a primeira vez

Crônica de Luiz Fernando Veríssimo, no Blog do Noblat

Chove desde que o mundo é mundo, mas a chuva sempre nos pega desprevenidos. Não falo na chuva catastrófica como a que tem nos flagelado, mas na chuva comum. Na chuva que deveria fazer parte das expectativas normais de qualquer um que não vive num deserto. Que não deveria exigir qualquer alteração no seu cotidiano fora a necessidade de usar guarda-chuvas e o cuidado de evitar goteiras e poças.

E no entanto todas as vezes que chove nossas vidas são transtornadas como se fosse a primeira vez. Meu Deus, o que é isso? Água caindo do céu?! Com chuva todo o mundo se confunde, como se não houvesse precedentes. Com chuva o caos do trânsito vira um pavor, embora só seja o caos de sempre com água em cima.

O descaso que causa as tragédias quando a chuva é catastrófica é um corolário dessa surpresa sempre repetida. A imprevidência dos que constroem em áreas de risco ou a negligência dos que permitem a construção em áreas de risco vem da mesma recusa de ver o óbvio. A chuva é uma obviedade, não é uma novidade. A chuva anômala, catastrófica, também, pois temos uma longa história de tragédias como as destes dias. Mas a reação é sempre de incredulidade, nunca se reconhece o óbvio.

O problema do Brasil não é que as coisas não têm precedentes. Há precedentes para tudo que nos aflige. O problema é que os precedentes não nos ensinam nada.

Assim continuaremos reclamando que os esgotos pluviais não dão conta das grandes chuvaradas e precisam ser refeitos, até a inundação regredir e não se falar mais nisso.

Continuaremos protestando contra construções em áreas perigosas até os deslizamentos pararem e o tempo melhorar, e esquecermos.

E cada tragédia, como cada dia de chuva, será sempre como se fosse a primeira vez.

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