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domingo, 13 de junho de 2010

'O time do Dunga é muito burocrático'


Em entrevista ao jornal britânico The Guardian, Sócrates - "o maestro do meio de campo da Seleção Brasileira de 1982", segundo o jornal - fala sobre Dunga, a atual seleção, Lula, eleições, a Copa de 2014 e, também, sobre os seus vários projetos pessoais, entre eles, um futuro livro de ficção.

O que você anda fazendo ultimamente?

Tanta coisa que é difícil lembrar. Faço muitos seminários sobre liderança, relacionamento humano, esse tipo de coisa. Dou consultoria para projetos sociais e culturais e estou me envolvendo em projetos esportivos. Escrevo para jornais e revistas sobre esporte e assuntos gerais, como política e economia. Me apresento também na televisão e estou começando a escrever um novo livro.

Quando jogava futebol profissionalmente, você tinha formação de médico - o que aconteceu com essa carreira?

Não lembro quase nada mais de medicina. Há tantas outras coisas acontecendo...

Seu novo livro é sobre o quê?

É ficção e é sobre a Copa do Mundo de 2014 no Brasil. Ele deverá estar pronto em dois anos. Um bom propósito. A idéia é mostrar o Brasil para o resto do mundo.

Ficção - este é um novo caminho?

Sim. A idéia é criar diversos personagens estrangeiros que virão para a Copa do Mundo. O livro será uma compilação das histórias desses personagens e de como eles avaliarão o Brasil - as coisas boas do país e também os seus problemas.

O campeonato será pura ficção e a final será entre Brasil e Argentina, com os argentinos ganhando de 2 a 0, os dois gols do Messi. Ha, ha, ha! Se você tiver idéia de um personagem inglês, me diga. E aí, nós vamos colocar cada personagem em um cenário diferente, para depois juntá-los em um só lugar. Todos têm experiências diferentes no Brasil e nós queremos descrevê-las da melhor maneira possível.

Você pode imaginar, digamos, um chinês assistindo um jogo em Manaus no domingo e tendo de estar em Salvador para o próximo jogo na quarta-feira? Sem chance dele conseguir isso! Ele se perderá no Pantanal, depois se apaixonará por, talvez, uma coreana. Todos que vêm ao Brasil se apaixonam por alguém. Óbvio! Somos o país mais sexualizado do mundo.

Quem vai ganhar a (atual) Copa do Mundo?

Nem Deus sabe. Na verdade, eu não tenho a menor idéia. Mas, os países que contam são: Brasil, Holanda, Inglaterra e Argentina, se eles tiverem bons times.

Você gosta do time brasileiro?

É um time muito burocrático, muito conservador... eles terão problemas. Há um novo garoto em Santos, Paulo Henrique (Ganso), que é excepcional. Ele já é o melhor jogador do Brasil. Está jogando maravilhosamente bem e o Dunga não quis levá-lo. Também não quis o Ronaldinho (Gaúcho). Ele escolheu só jogadores de meio de campo defensivos, jogadores que marcam, que correm. Se Kaká não estiver bem, o time ficará desnivelado.

Mas Dunga não está simplesmente usando o bom senso?

Ter bom senso não é sempre a melhor coisa. Quem diz que bom senso é sinal de qualidade? Eu acho que não.

Então, quem você levaria?

Paulo Henrique (Ganso), para começar. Ronaldinho também. Jogadores criativos.

A, digamos, coerência da seleção do Dunga pode simbolizar o fato de o Brasil ser considerado um país mais "coerente" nos dias atuais?

Dunga é gaúcho - ele é do extremo sul do Brasil - e eles são os brasileiros mais reacionários. Seu time é mesmo muito coerente, mas em termos da visão que ele tem do mundo, dos seus princípios. Eu entendo porque ele escolheu o time que ele tem. Só não acho que esse time seja muito brasileiro.

Outro grande evento para o Brasil este ano é a eleição presidencial. O presidente Lula, do Partido dos Trabalhadores, vai sair depois de dois mandatos consecutivos. Como foram os anos Lula para você?

O seu governo foi o melhor da história do Brasil. Ele foi muito bom em vários aspectos. A possibilidade de participação de uma grande parte da população no mercado consumidor aumentou. A qualidade de vida para muitas pessoas se tornou melhor. A diplomacia internacional tem sido fantástica.

Se você tivesse que dar uma nota ao presidente Lula que não fosse 10?

Dez, não. Para isso, você teria que mudar tudo de uma só vez. Eu daria um sete ou oito, e isso é muito bom.

Você vai votar na candidata do Partido dos Trabalhadores, Dilma Rousseff?

As propostas ainda não estão claras. Vamos esperar os debates.

O mundo tem dado uma grande atenção aos países BRIC (Brasil, Rússia, Índia e China). O Brasil realmente está no mesmo nível dessas potências?

O país é fantástico. Nós temos energia renovável, combústiveis fósseis. Temos muita água - mais do que qualquer outro país. A única coisa que não temos é uma população bem preparada. Mas isso vai acontecer. Haverá um tempo em que as pessoas vão procurar por isso.

O que precisa mudar aqui é o foco no desenvolvimento. Nós precisamos priorizar o ser humano. Infelizmente, no mundo globalizado, as pessoas não pensam nos indivíduos da mesma forma que pensam no dinheiro, na economia, etc, etc. Em um país como o nosso, eu acho que é preciso mudar o foco.

Quanto o Brasil está realmente se modernizando? Por exemplo, olhando lá para frente, na Copa do Mundo de 2014, o lado administrativo do futebol está agora menos corrupto do que era antes?

Não. Nem os nomes das pessoas que comandam mudaram. Nesse aspecto, nada mudou. Haverá problemas de infraestrutura, sem dúvida. Haverá muito dinheiro público desaparecendo nos bolsos das pessoas. Estádios serão construídos e ficarão lá para o resto de suas vidas sem ninguém usá-los.

Tudo vai girar em torno do dinheiro. O que o povo precisa é pressionar por melhorias na infraestrutura, transporte, saneamento, mas reconheço que isso vai ser difícil.

Você era reconhecidamente um fumante inveterado. Ainda fuma?

Sim, é claro. Talvez um pouco mais do que antes.

Matéria traduzida e editada pelo RA.

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